Mulheres estupradas porque usam roupas curtas, homossexuais agredidos por assumirem sua identidade, crianças medicadas por serem agitadas demais, idosos hostilizados por não terem mais uma audição apurada... Na verdade, o motivo da agressão pouco importa, o essencial é poder criticar, julgar e externalizar a raiva, independentemente de quem seja o “alvo”.
No início da década de 70, Stanley Kubrick dirigiu o filme “Laranja Mecânica”, adaptado do livro homônimo de Anthony Burgess. Ele conta a história de Alex, um jovem rebelde e inteligente que, juntamente com um grupo de amigos, tinha por diversão praticar a “ultraviolência”. Esses jovens (todos homens) assaltavam casas, espancavam mendigos e estupravam mulheres por prazer, deixando claro seu cinismo e descaso para com os outros e a sociedade.
As agressões geralmente são direcionadas às minorias hostilizadas, sempre mudando seu público. Leprosos, doentes mentais, negros, homossexuais... Novamente, a minoria em questão pouco importa, desde que sempre haja um grupo para o qual todo instinto agressivo possa se voltar, contando com uma justificativa socialmente aceitável nas propostas de exclusão-inclusão social.
A notícia da adolescente estuprada por mais de trinta homens não parou de circular na mídia. Essa “ultraviolência” é reforçada pela cultura patriarcal e é o último ato do machismo. Afinal, quem nunca ouviu que lugar de mulher é em casa e não no trânsito ou no mercado de trabalho? E as famosas “cantadas de pedreiro”? A cultura da violência é tecida aos poucos, de modo que a mulher sente-se envergonhada por ser vítima de um sistema disfuncional.
O simples fato de justificar uma agressão é tentar “normalizar” uma situação ilegal. Não há justificativa para a intolerância e falta de respeito. A ultraviolência tratada em “Laranja Mecânica” reflete uma educação deficitária e uma desigualdade de gênero absurda. Desde o bullying ignorado na escola até o assédio sexual no trabalho, a sociedade precisa falar sobre o assunto, não apenas reproduzi-lo em campanhas nas redes sociais. É a ação que muda o rumo da intolerância cotidiana.
Para dúvidas, críticas e sugestões, escrevam para: renataseren@gmail.com
Psicóloga - Renata Seren