O transtorno mental não tem fisionomia. A doença é silenciosa, mas presente, e cresce lentamente como uma flor na mente da pessoa, criando raízes obscuras e cinzas. O caso do vigia que ateou fogo na creche em Janaúba, o atirador em que matou pessoas durante um show em Las Vegas e outros tantos homicídios e suicídios não são apenas tragédias... são mortes anunciadas.
Uma doença psiquiátrica não se desenvolve em poucos dias. É necessário uma quantidade e uma duração de sinais e sintomas, além de considerável prejuízo na vida social, profissional e acadêmica da pessoa. O vigia já havia sido diagnosticado em 2014 com “transtorno delirante persecutório”. O atirador americano tinha 42 armas em casa. E o que foi feito? Deram atenção ou acharam frescura a pessoa pensar que estava sendo perseguida? Acharam algo normal colecionar tantas armas?
A doença está na mente, mas as causas estão também no ambiente. Onde estavam os entes queridos desses homens? Onde estava o suporte social que eles tanto precisavam? Quem se dispôs a ouvir seus problemas e angústias? Não é apenas uma sessão com o psicólogo que mudará a vida da pessoa. Não é uma consulta com o psiquiatra que resolverá o problema com um remédio. Assim como outras doenças, o transtorno mental é coisa séria e requer um tratamento adequado.
Ninguém fica triste, sem motivação ou solitário porque quer. São diversos acontecimentos que levam a pessoa a se sentir assim. Em um ano é a perda de um ente querido, um assalto, anos depois o desemprego, a separação... nada acontece e passa. A vida é a mesma e a história apenas continua. E a pessoa tem que absorver tudo isso, lidar com o dia a dia desgastante e seguir em frente (e de preferência sorrindo). Afinal todo mundo sofre não é mesmo? Então cada um com seus problemas.
O discurso é sempre o mesmo: “Fulano nunca deu sinais de que iria fazer isso. Parecia tão feliz esses dias.” O transtorno mental não tem fisionomia. Esqueçam o clichê da depressão como alguém triste pensando em acabar com a vida. Abandonem a ideia do psicopata como um indivíduo frio e calculista que sempre maltratou os animais. Cada transtorno tem suas expressões e silêncios. Basta parar a correria de dizer “Bom dia! Tudo bem?” e nem esperar a resposta do outro. Você pode evitar uma tragédia anunciada com um simples gesto de atenção.
Psicóloga - Renata Seren