Há cerca de duas semanas uma mulher foi vítima de assédio sexual no ônibus em SP. O agressor, que já foi preso outras quatro vezes por motivo semelhante, foi solto e repetiu o crime em menos de uma semana. No entanto, para o juiz que julgou o caso, “não houve constrangimento.” Se passar vergonha não é algo constrangedor, é o que então?
Todos os dias centenas de mulheres são incomodadas nas ruas com algum comentário machista, um assovio, uma cantada... O fato de andar sozinha já faz os homens sentirem-se mais corajosos para tentar uma aproximação. Caso haja uma retaliação, o agressor justifica-se dizendo que a vestimenta da mulher era provocativa e por isso ela estaria se insinuando. E desde quando SOMENTE a roupa é um convite para algo a mais?
Essa desculpa, apesar de obsoleta, continua sendo usada para sustentar machismo e o modelo de sociedade patriarcal. Os meninos não devem chorar e devem ser os “chefes” da casa, enquanto as meninas devem ter filhos e não uma profissão. Assim, a ideia de cultura inclinada ao machismo é ensinada, ainda que inconscientemente, desde cedo por meio de brincadeiras infantis e famosos clichês, como: “Comporte-se como uma mocinha” ou “Menino é mais arteiro mesmo.” Em outras palavras, homem pode tudo; mulher nem tudo.
É nessa ideia internalizada de sociedade patriarcal que muitas mulheres suportam o assédio sexual e até mesmo a violência doméstica. A vergonha e o medo da denúncia levam a mulher a justificar o crime dizendo que ela deve ter feito algo para “merecer” esse castigo. Suportar as investidas de um superior no ambiente de trabalho, os assovios ao atravessar a rua...
“O transporte é público, meu corpo não” é o que compartilhavam diversas mulheres nas redes sociais. O direito constitucional da liberdade encontra-se ameaçado. Com que tranquilidade se vai de casa ao trabalho se a cada 11 minutos uma mulher é violentada no país? Para que denunciar se o juiz poderá alegar que não houve constrangimento? O sentimento de vergonha é irreparável. E em pleno 2017, ainda precisamos defender nossos direitos de igualdade e liberdade.
Psicóloga - Renata Seren