Entrevista com o escritor Cezar Augusto Batista

A produção literária do escritor Cezar Augusto Batista tem uma narrativa pautada pelo estilo eclético.  Através do seu livro inaugural "Como (Não) Administrar: Lições Extraídas do Cotidiano de Um Grande Banco no Brasil", analisa, com densidade humanística e integridade de caráter, algumas posturas em Administração. Inclusive as fragilidades e inconstâncias do mundo corporativo.

Em outro desdobramento do seu estilo, faz incursões filosóficas sobre a literatura da psique. Lança: "Soltando-se dos Braços da Depressão", o voo; "Ame-se: Ensaio sobre a Autoestima", o sobrevoo. Neste último, elabora um ensaio filosófico que está, na maioria das vezes, ausente em outros autores do tema.

Por último, salta para  a Crônica, gênero literário leve, com saborosos casos do dia a dia. Publica: "Vamos Gozar a Vida? " e "Gutas", entre outros. Recentemente, publicou  “Sangue & Sedução”.

Aceitou colaborar com nossa coluna concedendo-me esta entrevista. De início, endereçamos perguntas pertinentes ao seu solo profissional, o autor é aposentado do Banco do Brasil. Natural de Maringá, estado do Paraná,  veio ainda criança para Ribeirão Preto, onde reside. Tem um vínculo com a cidade de Bebedouro, esteve por aqui muitas vezes. Sua irmã, Angelina Batista Cunha, é viúva do conceituado cirurgião-dentista bebedourense Arlindo Pereira da Cunha.

Em seguida, abordamos o Cezar escritor. São nove livros publicados e duas reedições. Uma façanha para um escritor independente uma vez que - no mercado editorial - Harry Potter foi recusado por uma editora que sua autora procurou. 

Cezar e eu já pisamos muitos chãos comuns e a cada conversa vamos descobrindo outros. Aliás, éramos velhos conhecidos sem nunca nos termos visto. Recentemente, tive o prazer de conhecê-lo pessoalmente.

De uma forma cúmplice e silenciosa, firmamos um pacto a respeito desta entrevista: seguir a máxima de que "...em negócios não cabe o sentimentalismo da amizade, mas o rigor das garantias". Parece uma conduta fria, mas não é. Note-se, porém, esta diferença: não havia outro caminho ético - entre dois amigos e irmãos em mais de uma escola filosófica - para respeitar o leitor que se deparar com esta matéria. E assim foi feito. Não se puxa o tapete debaixo dos pés do leitor.

As perguntas foram rigorosamente elaboradas e da mesma forma respondidas. Ou seja,  perguntas e respostas concretas ao invés de vagas. 

Parabenizo-o, Cezar, por escrever sem timidez filosófica  e ajudar tantas pessoas a se tornarem melhores, após emergirem do mergulho nos seus textos de autoestima/autodisciplina filosófica e seguirem a vida, sem sobressaltos. Então, vamos à entrevista:


Nas empresas, dentre outros, há dois eixos que  se confrontam, mas na realidade teriam de se completar: o comercial e o humano. A sobrevivência no mercado prioriza o aspecto comercial. Nele, somente nele, investem-se "injeções motivacionais". O capital humano das empresas carece de solvência afetiva, isto é, não recebe afeto. Por quê?

No meu caso, vivi dois tempos bem diferentes: em um deles, preocupava-se com o desempenho da instituição e também com o bem estar dos funcionários; em outro, a preocupação passou a ser apenas com os números. Felizmente, aposentei-me porque vejo, e claro não sou somente eu, que a cobrança sobre os funcionários atuais é muito grande, às vezes chegando a ser desumana. De modo geral, embora os homens de recursos humanos tentem manter e evidenciar o valor do trabalhador como ser humano, o Capitalismo torna-se a cada dia mais predatório.


Você conheceu as apostilas para concursos do Banco do Brasil, autor Júlio Cunha, seu colega de banco. Destaco a de Matemática Financeira, 564 páginas, cujo aspecto didático é a metodologia por raciocínio e por fórmulas (com objeções a algumas destas por não serem eficazes em alguns casos).

Qual a importância desse material de estudo na sua vida?

Importância muito grande, não só para conseguir ser aprovado no concurso de admissão, como também para aprendizado e consulta por longo tempo. Mas para falar a verdade, não tenho nenhuma apostila dele comigo e há muito não as vejo.

Esta pergunta me faz lembrar de outra apostila que utilizei durante um largo período e emprestei a muitos amigos, e que não mais possuo: era apenas de matemática, elaborada também por um colega com o qual cheguei a trabalhar em meados da década de 1970, na agência Centro Ribeirão Preto, a única da cidade à época, Ricardo Amidani. Ele chegou a escrever um livro sobre o problema das “filas”.


Quando nasceu Cezar Augusto Batista, o escritor?

Antes de aprender a ler e escrever no papel, já escrevia no meu cérebro. No papel, logo que aprendi a ler, uma das minhas irmãs indicava-me os livros e me fazia  comentar por escrito. 


Quais dos seus livros são intimistas, confessionais?

“Soltando-se dos braços da depressão”. -  numa das orelhas = "poucos tiveram a sua coragem: revelar os sentimentos por trás do escuro véu que turva os olhos para os momentos alegres do viver’.


O seu livro “Soltando-se dos Braços da Depressão” parece ter   um paralelo involuntário – o que é um deleite para o leitor – com “Ame-se: Ensaio Sobre Autoestima”, publicado  posteriormente àquele. Procede a minha  analogia?

Procede, sim. Escrevi o segundo sem mesmo perceber a ligação entre os dois.

Quem observou foi uma amiga de mais de 40 anos, Rosacruz, com quem trabalhei na Prefeitura e depois, coincidentemente, no Banco. Ela foi uma das poucas pessoas que conseguiram ir a três lançamentos dos vários que realizei. Muitos amigos, por motivos de força maior, não foram, mas compraram todos. Disse-me: “Poxa, Cezar. Um livro complementa o outro”. Seu nome: Florícia Akiko Sawada Carvalho, o qual consta na dedicatória do “Histórias de Arquibaldo”.

Ressalto que o “Soltando-se dos braços da depressão” é de foro íntimo, enquanto o “Ame-se – ensaio sobre autoestima” é impessoal, e ouso classificá-lo como ensaio filosófico.


Em “Sinta-se Grato”  - livro de uma essência exuberante – solidariza-se com o amor que recebe. Reconhece as pessoas que não ficam assistindo às dores, aflições e outras mazelas pelas quais o ser humano passa. Ao contrário, assumem o sofrimento do outro e entram em ação para ajudá-lo. Inclusive, narra fatos reais.

Num outro extremo, anula a Lei do Revide com esta frase “Seja grato pelo amor que recebe, seja da mesma maneira pelos ataques que pensam que lhe fazem”.

É possível que um dia, mesmo considerando que a pulsão é uma energia de caráter inconsciente, o ser humano elimine totalmente a pulsão do revide.

O ‘pensam que lhe fazem’ significa que os outros podem querer atingir-nos, mas se conseguirmos neutralizar esses ataques, eles apenas tentarão nos machucar. Creio que a eliminação total do impulso do revide não ocorrerá. Porém, todos podem trabalhar para que seja cada vez mais diminuto e mais adequado.

A meu ver, a autoestima pressupõe algo inseparável que lhe proporciona sustentação, a autodisciplina. Ela é o processo mais difícil para a manutenção da condição comportamental da autoestima uma vez que deverá ser uma postura  permanente, ou quase,  diante dos obstáculos a transpor no dia a dia. 

Qual a sua opinião?

A manutenção é diuturna. Precisa-se trabalhar contra os pensamentos autodestrutivos e contra os ‘ataques’ externos, sem fazer disso uma prisão. O ‘ponto de equilíbrio’, comentado no livro, é fundamental. 


Você escreveu com mestria: "O difícil ‘na autoestima’ (aspas simples minhas) é não deixá-la cair”.  Sendo a autodisciplina uma espécie de sombra da autoestima, não dá para separá-las. Juntas, evitam a derrota do sujeito (termo utilizado na psicanálise e outras ciências "Psi"). Surgem, então, duas questões:

É possível, através da autoestima/autodisciplina, escapar à camisa de força química da medicação? Ou então, os medicamentos seriam essenciais para colocar a pessoa em condições de alcançá-las?

Como leigo, penso que. em alguns casos, há necessidade de medicação. Mas a autodisciplina e o constante cuidado consigo mesmo são sempre necessários.


A autoestima exige,  entre outras atitudes, o descarte de procedimentos inadequados, inúteis subjetivamente, que são localizados e eliminados quando o Homem volta-se para dentro de si com o fim de emergir, saudavelmente, para fora. E aqui caímos na equação de Sócrates e Nietzsche: “Saúde é pensamento e pensamento é saúde”.

Em “Ame-se: Ensaio Sobre Autoestima” há uma narrativa  profundamente filosófica. Qual o motivo da sua preferência por esse gênero nesse livro?

Tentei, realmente, elaborar um “ensaio”: impessoal e universal. Alguns acham que consegui, como você pela pergunta; outros, não. 


Os médicos, respeitadas as exceções,  até por uma questão de tempo, da estrutura e pressão do sistema, prescrevem uma lista de exames obviamente necessários. Dessa forma, a relação médico-paciente fica apenas visual, menos auditiva. Portanto, há nisso um certo esvaziamento afetivo, um  mecanicismo clínico que substitui o diálogo, ou seja, desaparece a atitude filosófica que você adotou em  “Ame-se: Ensaio Sobre Autoestima”  e, de certa forma, no livro "Soltando-se dos Braços da Depressão" . Quando extremamente necessário, recorre-se, para preencher essa falha, ou às especialidades "Psi" ou à Filosofia Clínica,  embora me pareça que esta última ainda não seja reconhecida. 

Conte-nos a sua maneira de pensar o assunto.

Penso que a indústria farmacêutica ‘dita’ muitos procedimentos médicos, exames laboratoriais, receituários. Quanto à maioria dos profissionais  ficarem olhando o computador ao invés dos pacientes, o que foi alvo de uma crônica minha, se não me engano no “Crônicas... de todos nós”, de 2006, tem sido comentado, até mesmo,  por outros colegas deles.


Alguns escritores sempre esperam surgir o melhor poema, o melhor texto, mas eles não vêm. Esse, também, era o ponto de vista da crítica literária sobre a obra de Oswald de Andrade. Na condição de escritor independente bem sucedido, dono de uma fortuna crítica (obra) respeitabilíssima, qual o seu conselho para os escritores que padecem desse tipo de problema?

Não me julgo assim, não; contudo penso que escrevi algumas ‘coisas boas’. Sempre queremos melhorar, e com excessiva autocrítica, sonhamos em escrever “nossa obra-prima”. Acredito que a maioria dos “grandes” também não considerou que já a tivesse escrito.  


Os círculos mais estreitos da Literatura causam expectativas nos autores    pelo conteúdo da crítica literária. Mário Quintana não concordou e emitiu uma opinião interessante: “Escrevemos para os leitores, que são os nossos “contemporâneos”.  Conclui-se, portanto: onde obviamente o crítico (o círculo) não está presente.  Como você reage a isso?

Triste, mas não me vejo no círculo dos alvos dos críticos literários. E nem mesmo dos leitores em geral, porque tão pouca gente, amiga ou não, comenta os meus livros, embora saiba que muitos os conhecem.  Baseando-me pelo Facebook, considero que poucos leem e menos, ainda, comentam sobre livros, sejam de autores regionais, nacionais ou internacionais.


A sua vitalidade literária produziu oito livros e duas reedições. Quando virá o próximo livro?

Tenho uma ‘miscelânea’ de textos que já dá um livro. Dentro dela há dois assuntos que tenho intenção de desmembrar em dois outros trabalhos. E também escrevo um Romance, porém muito devagar.  Escrever e publicar torna-se um hábito, para não chamar de vício, e talvez no final do próximo ano -2017- publique de novo. Dependerá, também, do número de exemplares que ainda possuir do “Histórias de Arquibaldo” e “Vamos gozar... a Vida?”. Do “Ame-se – ensaio sobre autoestima”, acredito e espero que não tenha mais para comercializar até o final deste ano.


Em sua opinião, a vida “muito no lugar” faz o escritor não escrever?

Acredito que sim. Quanto mais desafios, mais sou impelido a desabafar, redigindo. Quanto mais fatos tenho a observar, mais enxergo motivos para relatar.

Você já fez Yoga ou apenas teve contato com a literatura que trata do assunto?

Fiz em grupo e também como autodidata. Quando jovem li dois livros do professor Hermógenes e pratiquei um pouco. Há, aproximadamente, dez anos e por uns três pratiquei meditação e Yoga baseadas nos ensinamentos de Osho, cujos ‘discursos bebi’ transcritos em torno de 26 livros. Aprendi muito e foi a vivência desse período que me inspirou o “Sinta-se grato”.


Num curso de Parapsicologia, foi aplicada a Regressão de Memória em uma participante. Por sinal, uma técnica milenar hoje também usada na Psicologia Transpessoal. Em seguida, o parapsicólogo - eu estava lá - me olha e diz:

-Ela está com dois anos de idade, peça-lhe que faça algo compatível com essa época. Com um olhar pidão, pedi:

- Faça xixi e ela fez. Fui injustamente jubilado do curso.  A minha pergunta, pelos efeitos práticos que provocou, ao contrário de algo bizarro que se possa pensar, materializou a credibilidade do curso. Pergunto: Você crê que a Regressão de Memória sustenta a tese de que o orgânico não está separado do psíquico?

Agora, sou eu quem faço uma pergunta: ela não lhe bateu quando retornou?

Creio que em nenhum estado haja separação do físico com o psíquico. 


Augusto Aguiar

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