Sai a data, entra a dúvida

No Brasil,  as revistas periódicas de consumo são de uma cultura editorial excelente. Há muito tempo, no entanto, algumas adotam uma postura indelicada com o leitor:   omitem a data da circulação na capa ou no expediente. Veja só, leitor, a resposta à minha abordagem crítica. Ou reclamação, caso queiram, que enviei a uma delas:


“Esclarecendo o problema: entendemos que explicitar o ano e o mês de publicação no expediente é melhor para nossos leitores, que encontram material de referência certo e que podem, assim, se situar entre seus números.


Porém, não incluir esta informação é uma decisão do editor (...) e a redação não tem poder de decisão neste fator. Os responsáveis nos garantiram que em breve seria adicionada a informação de mês e ano, mas não nos deram uma data precisa para isso. Ainda assim, peço desculpas em nome da equipe e da editora (...). Sua reclamação será encaminhada diretamente para o responsável”.


Bem se vê a procedência daquilo que reivindiquei. Entretanto, pelo conteúdo da resposta, vê-se que uma área da editora, a Redação, foca o cliente; a outra, a Editoria, não foca. Mais de um ano depois, apesar dos esforços da Redação, o problema não foi sanado. Difícil, não é? Fácil seria abolir esse tipo de falcatrua. No meio editorial a intenção desse recurso visa  mascarar o número de edições vendidas.


A ausência da data da circulação também compromete a fixação da imagem e do conceito dessas publicações e dos patrocinadores. Estes, às vezes, nem se dão conta dessa manobra.  Alguns deles, não há dúvidas, pactuam com esse desrespeito. Entendem que os seus produtos adquirem a condição de atuais. Mas se enganam. Estou escrevendo para diversos patrocinadores. A intenção é despertar os que são éticos na divulgação daquilo que comercializam como produto final.


Uma revista é um importante suporte de textos. Aquelas a respeito das quais faço abordagens críticas existem em todas as áreas: Variedades, Direito, Língua Portuguesa etc. Em algumas delas – as da área de Direito, por exemplo  –  as matérias ficam inócuas sem a data. Os seus textos levantam dúvidas quanto à  aplicabilidade no que concerne à sua vigência ou não.


Mesmo o leitor leigo em Direito, mas com relativo potencial para entender um texto pautado por um padrão técnico de expressão, ressente-se da falta desse componente imprescindível, a data da circulação. Ela é uma convenção universal. Proceder de forma diferente gera a quebra de confiança entre leitor e revista. O que os Editores fazem é um desrespeito tão grave quanto o desrespeito costuma ser.


Não consigo entender como um articulista renomado publica artigos em um veículo que coloca em prática essa linha de ação. Recentemente, uma musa impressa que adotava a postura de omitir a data da circulação, fechou o título (encerrou suas atividades). E para ela mando a seguinte mensagem: “Fechou, com o meu aplauso”.


Onde havia um moleque, um jovem, um homem ou uma sacanagem, havia um Catecismo.


Em todas as fases da minha adolescência, lá pelos anos 60, até o Catecismo, revistinha de sacanagem criada por Carlos Zéfiro, trazia a data. Escondidinha, mas trazia. Com isso, esse gênero, apesar de ser uma publicação clandestina, respeitava os leitores. Que não eram poucos, por sinal.   Aliás, no que se refere a essa publicação, tudo era escondido: a criação, a impressão, a colocação no mercado e o consumo final. E o próprio autor, que só veio a público nos anos 90 (a publicação começou em 1957),  aos setenta anos de idade.


Esse tipo de publicação equivale aos filmes pornográficos de hoje. As imagens reproduzidas representam o que está sendo narrado.   Onde havia um moleque, um jovem, um homem ou uma intenção de sacanagem, havia um Catecismo (com o inesgotável universo temático desse gênero). Sempre por baixo da camisa, enfiado entre a calça e a barriga. Ou em forma de rolo naqueles enormes bolsos das calças de antigamente. Enfim, em todos os lugares possíveis de se esconder algo.


Nem precisaria conter data de publicação; os Catecismos retratavam um assunto atualíssimo desde Adão e Eva, sem risco de perder a vigência. Mas  por respeito aos leitores, continham a data de publicação. 


Augusto Aguiar

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