Caipira Picando Fumo

Em 8 de maio de 1850, nascia em Itu uma estrela que jamais perdeu seu brilho. José Ferraz de ALMEIDA JÚNIOR, um dos mais importantes pintores brasileiros, destacou-se retratando em suas telas toda a essência e beleza rústica do ambiente que circunda o homem matuto, caipira de corpo e alma. Ele é considerado o primeiro artista brasileiro a levar para as telas essa temática regionalista. Ou seja, o cotidiano do homem caipira.  O seu olhar enxergou a sua terra como uma obra de arte. Trabalhava a partir da minuciosa observação da vida no campo e utilizava modelos reais, geralmente amigos, funcionários das fazendas da sua família ou até desconhecidos habitantes dos arredores de Itu S.P., que convidava a posarem.

Ao isolar o caipira, mostrando-o como uma pessoa solitária e despojada, ele é representado no manejo pacífico da faca.

Há, no entanto, outro olhar interpretativo nas pinturas de Almeida Júnior. A revista Campo & Cidade, da Estância Turística de Itu  e o professor Jorge Coli - disciplina da História da Arte e da Cultura da Unicamp - autor do livro A violência e o caipira - remete-nos a esse olhar. Aponta-nos tensões presentes no universo retratado pelo pintor: "Ele pinta um cotidiano falsamente neutro, em que as ações de violência estão contidas".  Na pintura do Caipira Picando Fumo, por exemplo, mesmo que não seja intencional, a faca é um instrumento que apresenta potencial de violência.  A presença de armas repete-se noutras pinturas de Almeida Júnior: "Derrubador Brasileiro", o machado; Caipiras Negaceando, a espingarda. Ao picar o fumo, o caipira utiliza uma faca fina e longa. Ela está no centro do quadro, no meio exato de uma cruz formada pelos antebraços, pela costura da braguilha, pela abertura da camisa no peito, cujo V funciona como uma seta (que pode ser equiparada a uma arma), apontando de cima para baixo.

Sem nenhuma concessão a um pitoresco feito de detalhes supérfluos, o picador de fumo, na sua postura concentrada, expondo de modo tão crucial a sua faca, interpondo-a de fato entre si mesmo e o admirador do quadro, protege-se, protege sua autonomia individualizada, protege, pela violência possível, o lugar frágil que ocupa no mundo.


Augusto Aguiar

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