Diante da situação conturbada em que vivemos, ficamos perplexos e quase impotentes com o comportamento da sociedade nacional e internacional. Assim, é muito comum desejar a “paz” e exigir “liberdade”. Porém, o que se entende por essa “liberdade” e “paz”? Constatamos uma cobrança constante de justiça, de direito de comportar-se sem restrições, de liberdade plena de expressão etc. etc. Mas o que dizer dos deveres e obrigações decorrentes, das consequências, da responsabilidade social e particular?
Todos nós, indubitavelmente, tendemos a optar não pela verdade e imparcialidade, mas pela conveniência. Daí usarmos em nossas considerações “dois pesos e duas medidas”, sempre em defesa de nossas vantagens e pseudosdireitos. Esse comportamento nos leva a calorosas discussões, agressões, atitudes injustas e separações desnecessárias.
E quanto à “paz” que tanto desejamos e apregoamos aos quatro ventos? Já se disse antigamente: “Si vis pacem para bellum”, isto é, “se queres paz, prepara-te para a guerra”.
Esta é a lógica do mundo. Esta “paz”, porém, Jesus não a quer. E com razão nos diz que não é esta a sua mensagem. A “paz” fundada na mentira e na aparência, na convenção fácil que acumula problemas para o futuro não é a paz de Jesus. Quão longe estão de sua mensagem a “paz” superficial, que só quer salvar as aparências; a “paz” armada; a “paz” que se impõe pela força e que, amiúde, custa mais que uma terrível guerra; a “paz do cemitério”, onde ninguém opina e onde ninguém pode discordar. Sob o manto desta aparente pacificação, existem violências escondidas e atrozmente mortais.
Quando um povo está “petrificado” pelo temor, certamente não está saboreando o fruto da verdadeira paz.
Os pobres e os que carecem das mais elementares oportunidades de viver com dignidade podem ser testemunhas de que este não é o caminho por onde passa a salvação do mundo. Nestas circunstâncias, não são filhos da paz os que se calam, mas os que se atrevem a denunciar o mal. Tampouco é a paz do Evangelho aquele passar bem sem pensar nos outros. E um mundo que procura o prazer pelo prazer, que rechaça a fidelidade, que desconhece o heroísmo confundem-nos os termos. E a “tranquilidade”, o bem-estar material, a carência de problemas, as diversões, a distração e o esquecimento terminam por paralisar o coração, sem lhe proporcionar o verdadeiro repouso.
Ao longo da história do Cristianismo, correu muito sangue de mártires... e foi a melhor semente da fé. O Evangelho nunca foi um “sedativo”. Muitos discípulos de Cristo entregaram sua vida para que o mundo pudesse realmente viver. “É um fogo que vim trazer à terra, e como quisera que já estivesse aceso” (Lucas 12,49). A chama do Evangelho convida a nos desacomodarmos... Que esse fogo arda em nossos corações e que assim comece a ser ateado no mundo. E então alcançaremos a paz que o mundo não pode nos dar (João 14,27).
Essa reflexão nos obriga a interrogar-nos com honestidade sobre como nos inserimos neste mundo.
“Senhor Jesus, que dissestes aos vossos apóstolos: ‘Eu vos deixo a paz, eu vos dou a minha paz’, não olheis os nossos pecados, mas a fé que anima a vossa Igreja; dai-lhe, segundo o vosso desejo, a paz e a unidade”.
Cônego Pedro Paulo Scannavino Paróquia São João Batista