O equívoco involuntário da Praça Jarbas Aymoré do Prado

Antes de qualquer coisa, importa dizer que o professor Jarbas Aymoré do Prado foi uma pessoa diferenciada. Por sinal, dotado de uma imensa densidade humanística. Em 1965, exercia as funções de Diretor do Instituto Estadual de Educação Dr. Paraíso Cavalcanti, o Ginásio.


Naquela época, como em todas as outras, os livros didáticos eram uma sacanagem comercial. A fim de ajudar as vítimas desse sistema, esticava o máximo que podia as parcelas dos livros didáticos que minha mãe e os pais de outros alunos adquiriam através da Caixa Escolar. E vou ser sincero, ele pagava do próprio bolso muitos desses livros para os alunos carentes.


Nosso município cometeu um equívoco na tentativa de homenagear o professor Jarbas Aymoré. O Decreto nº 536, de 12 de outubro de 1970, publicado na edição nº 2.376, de 18/10/1970, da Gazeta de Bebedouro, tem a seguinte redação: “ARTIGO 1º - Fica denominado ‘Praça PROF. JARBAS AYMORÉ PRADO’, o logradouro público onde se acha localizado o edifício da Agência dos Correios e Telégrafos desta cidade (...)”.


O local destinado à aplicação do Decreto 536 é propriedade da União, Nele, há o prédio onde funciona a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, criada em 20 de março de 1969 (a criação dos Correios no Brasil é outra coisa). Vê-se, também, que a razão social dos Correios – considerando a data da vigência da fonte legal que deu denominação à praça e à da criação daquela empresa de comunicação - está grafada errada no Decreto.


Por outro lado, o que o relator do texto quis dizer com “... o logradouro público onde se acha localizado o edifício da Agência dos Correios...”? Considerando a suposição de que a área destinada à praça fosse da municipalidade, ele grafou logradouro público no sentido de espaço público, livre, franqueado ao uso comum dos cidadãos.


No entanto, aquela área, de acordo com a escritura do imóvel, não é da prefeitura, mas dos Correios. Apenas possui – com um nível aceitável de qualidade estética - o aspecto de um espaço público municipal, disponibilizado por aquela empresa aos usuários que acessam as suas dependências. Essa é a finalidade daquele local. No entanto, na prática, o seu uso é de caráter geral.


Caso o autor da homenagem fosse o dono do terreno, aí, sim, teríamos uma situação correta. Trata-se, portanto, de um equívoco. Bem intencionado, claro. Aliás, merecidamente bem intencionado.


Alguns anos depois, a “criação dessa praça” quase gerou um desconforto a outro professor, o senhor Manoel Izidoro Filho, vizinho dos Correios, que – a seu ver - o local era um logradouro do munícipio.


Em 2002, ocorreu a reforma mais recente do prédio da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos em Bebedouro. Nessa ocasião, foram instaladas as grades protetoras ao redor dele. Pelo lado da Rua Antônio Alves Toledo, elas acompanham o alinhamento dos muros das demais edificações; pelo lado da Rua XV de Novembro, onde fica o imóvel do professor Izidoro, não acompanha.


Por quê? Abriu-se um precedente ao professor. A grade, em relação ao alinhamento da residência dele, foi recuada. Esse procedimento foi revestido do caráter da excepcionalidade. Caso contrário, o portão da residência seria aterrado pela rampa para pessoas com deficiências.


A adoção dessa postura permitiu ao professor e aos seus familiares a preservação dos seus laços afetivos com o lugar a ser encoberto e a continuidade da utilização do portão do alpendre que dá para a “praça” . Por sinal, um alpendre aconchegante e histórico. Mas para preservar isso tudo, alguns obstáculos tiveram de ser transpostos.


Tentei dissuadir o engenheiro dos Correios, Dr. Fábio Scatenna (já falecido), da intenção de isolar o portão. De início, não obtive sucesso. Na condição de meu superior imediato, determinou que o acompanhasse a fim de comunicar o fato ao professor.


- O que você pode fazer por mim, Augusto? – perguntou-me seu Izidoro com os olhos cheios de lágrimas.


Fiz um sinal para ele, apenas isso. Em seguida, saí a campo para resolver o problema.


Alguns dias depois, o engenheiro volta e me diz:


- Vamos recuar a grade em relação ao alinhamento que seria correto. Com isso, não haverá nenhum embaraço ao vizinho.


- Já estou sabendo. O vizinho também. – respondi.


Portanto, a rampa ali existente foi construída num estilo arquitetônico diferente daquele inicialmente projetado. Eu tive a oportunidade de ver o reflexo desse cuidado estampado na expressão de satisfação da fisionomia do professor Izidoro.


Os motivos da opção pela grade ao redor do prédio foram estes: o primeiro, conter o vandalismo no local. Por sinal, abusivo, a exemplo de todo vandalismo. Pelo mesmo motivo, a Fonte Luminosa foi gradeada.


O segundo, acabar com as cenas de sexo que aconteciam, durante a madrugada, entre as colunas sobre o patamar da escada que contorna o prédio pela parte da frente e lateral externa. Acredito – salvo engano meu – que os componentes masculinos dos casais que ali faziam sexo tinham ejaculação precoce. Sendo assim, não dava tempo de chegar ao motel, entre outros lugares apropriados para isso.


Por fim, o terceiro: evitar que bêbados (bêbedos) usassem o local para fazerem xixi, a exemplo de um da alta sociedade (?), morador nas imediações, que não se constrangia diante das crianças, senhoras etc. Malcriado, por sinal. Devia ter incontinência urinária. Nesse caso, os familiares não tiveram o cuidado e a responsabilidade de enfiar uma fralda nele.


Graças ao bom senso da direção daquela empresa pública, que reviu sua intenção inicial, tudo continua como era: a pracinha que leva o nome do professor Aymoré e o portãozinho do seu Izidoro. O bêbado (bêbedo)? Ele não está mais lá, graças a Deus.


Augusto Aguiar

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