Algo em comum

“Os homens morrem e não são felizes porque ainda não aprenderam a amar”. (Albert Camus)


O microscópico espermatozoide se conduz com muita avidez e existindo as condições apropriadas, ele fertiliza o óvulo, originando a vida, perpetuando a espécie humana. E o nenê, vai ter, além do DNA, algo em comum com os pais?

Pela mesma razão, os pássaros, borboletas, abelhas e o próprio vento polinizam as flores, produzindo a mais variada biodiversidade do bioma terrestre. E aparece o fruto e a semente que completa o ciclo dessa maravilhosa engenharia do Criador. Mas a humanidade, mesmo diante desse fantástico espetáculo, não se toca, não tem quase nenhuma parceria, nada em comum para preservar, resgatar essa fenomenal natureza. Muitos preferem acreditar que o planeta terra é uma colônia de férias... Até quando, ninguém sabe!

Para o filho, os pais são herois, ídolos, companheiros. A criança precisa muito do convívio paterno e diz que quando ficar grande quer ser como seus pais. Só tem um detalhe, nem sempre essas cabecinhas em formação vão ter os pais efetivamente como parâmetro de vida. Como ter algo em comum com pais que se aventuraram levianamente a parir, sem qualquer propósito ou comprometimento? Não souberam brincar com bonecas, saberão lidar com crianças? A vida adulta lhes é apresentada assim, de repente, com excesso de tudo, principalmente de irresponsabilidades e ausência quase total de bom senso. Como harmonizar esse vazio existencial? Como resgatar esses excluídos? E quem pagará o ônus por esse caos?

Infidelidade conjugal é outra evidência da escrota sem-vergonhice da espécie humana. Famílias enfraquecidas. Jesus por razões óbvias de comodismo do homem, nunca é lembrado. Mas a deslealdade acontece celebrando o abraço insano e patético dos afogados. Afinal, o que eles teem em comum? A ilusão de que a “nova descoberta” vai ser a solução para escapar das incompreensões do passado... Ledo engano! O homem que troca de mulher troca de problema e a recíproca também é verdadeira. É apenas uma ilusão momentânea, individual e enganosa, porque ninguém é dono de ninguém seja na esfera física, mental, emocional, espiritual. Por que o ser humano tem tanta dificuldade para entender que não precisa mudar o cardápio. A felicidade não vem por receber algo que não tem, mas por valorizar o que já tem. Tem cara que é perfeccionista para exigir dos outros, mas quanto a si mesmo é uma lástima!

Em sentido mais amplo o “algo em comum” não está no dinheiro, na beleza, no poder... Tudo isso é importante, mas, não chega a levantar a fervura, apenas seduz pela tepidez e deste modo o mundo vai ficando cada vez mais doente. Talvez seja porque está cheio de paraísos materiais artificiais, mas em contraposição carente de coisas tão simples quanto amar. Amar é uma decisão. Não é apenas um sentimento. O sentimento pode se enfraquecer, a decisão não! Se o amor só fosse emoção ele não seria um mandamento: “Amai-vos uns...”.

A vida sem ‘amar’ não tem significado. De nada adianta prazer, posses, projetos, faculdades, empregos... É como correr atrás do vento! O hoje sem amar não transforma, não revela a essência da vida. Já citamos aqui o pensamento de Machado de Assis sobre a ansiedade de amar: “As feridas da alma são cuidadas com carinho, atenção e paz”. Tradução: amar é algo em comum e está atrelado diretamente à paciência, compreensão, tolerância. Não são necessários artifícios para ser feliz. Deus se agrada daqueles que buscam sabedoria para honrá-lo. Esses se tornam melhor depois de praticar o amor.

Vivemos numa época de correrias, avesso às obrigações, regras, disciplinas. Com tão poucas coisas em comum as vidas vão sendo esvaziadas de significado e tudo se torna muito confuso, até o poder espiritual enfraquece. A esperança é que um dia a vida inteligente renasça em nós. Deus nunca se cansa de nossos recomeços!


Reflexão – O escritor Gabriel Costa ajuda-nos a entender como é esse processo transformador. Assim, quanto mais o mundo se apequena, mais obriga o homem ser criativos para transformar a dor em amor. “Já ouvi silêncios sábios e já ouvi conselhos vãos. Já vi beijos sem tocar os lábios e toque sem usar a mão. E dessa observância calma, um verso eu deixo de lição: Feliz é quem toca com a alma e enxerga o coração”.

Nota: Para saber mais sobre o tema leia Albert Camus: “O Mito Sísifo”, “O estrangeiro”, “O homem resolvido”, E com acesso tão fácil e com tantas informações boas, leia a Bíblia.


Antônio Valdo A. Rodrigues
Clima Bebedouro

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