Útil e inútil

“Quem tem o seu amor numa ilha distante, ama também os perigos do navegar”. (Rubem Alves)

 

A vida é sim uma vocacionada devoção. Este é o grande desafio: não é a vida ser bonita, é ser necessária, do jeito que ela se apresenta.

 

A caneta usada – “Qual é a diferença entre uma caneta esferográfica usada, e as pessoas?” Note que a caneta teve uma serventia e agora, será que há lugar para ela? A resposta é não! Assim são jogados fora: caneta, fogão velho, liquidificador que está rateando, ventilador que não ventila mais... Enfim eles já foram úteis, agora ‘ficaram velhos’ e não merecem ser guardados. Mas o mesmo não acontece com as pessoas. Enquanto ‘coisas’ teem serventia temporária, ‘seres humanos’ armazenam sabedoria, experiência. O corpo envelhece, a cabeça não! A existência é assim mesmo, tem ares de certeza negativa e ares de certeza positiva.

O que precisamos observar com atenção é que, itens materiais, são finitos, estão nos planos dos homens. Já a criação espiritual é diferente, é única, é eterna. Cada criatura é singular e está no infinito plano de Deus.

 

Automóvel velho – A fábrica faz veículos em série. Todos iguais com a mesma tecnologia e utilidade. Mas aquele utilitário, com o tempo, vai perdendo suas características. O bom desempenho que estava lá em cima do gráfico, vai deixando de existir, e a curva vai descendo até chegar ao nível zero na escala de valores. Dizemos que o automóvel agora é ‘velho’, não satisfaz e se torna inútil, uma sucata a ser abandonada.

Com o ser humano acontece o contrário, ele começa do zero e a curva do gráfico se move para cima no tempo programado pelo Criador. Em outras palavras, o automóvel vai perdendo a serventia e fica velho. O ser humano torna-se diferente. Ele vai aperfeiçoando, cada vez mais, o seu saber mesmo entendendo que o tempo é implacável e sua hora vai chegar...

Não é velho quem vive uma vida com mais significados; quem não precisa levantar a voz, porque melhora os argumentos; quem fala menos e compreende melhor o silêncio. Quer saber de uma coisa? O ancião dá-nos a impressão de ter, sempre ao seu lado, um “anjo instrutor cuidador”, auxiliando-o a conviver com graça e a paz, tão necessários para compensar as extravagâncias de um mundo que insiste em ser difícil. Com seu olhar de renúncias infinitas, o ancião se vê refletido na chama de uma vela e chega a pensar, até que ponto ele é como a vela, capaz de se consumir iluminando...

 

Amor ágape – Eterno, silencioso, sempre presente, assim é o amor ágape. A alma, a fé, a esperança, o amor, não podem ser vistos, mas, são os mais admiráveis elementos do tempo e da eternidade.

Agora, o da ‘idade experiente’, sabe isso direitinho e tem vontade de revelar a todos: “Conheçam e valorizem mais o que é ter uma vida de graça e paz. O espírito permanece, a matéria não!”. A lei é clara: amar as pessoas antes de amar as coisas. Carnalidade não é tudo. Vida é também graça maravilhosa, plenitude idealizada pelo Criador. Esse é o ‘amor ágape’, amor que se origina em Deus. Amor ágape é ‘outrocentralizado’ e não ‘autocentralizado’ e menos ainda, ‘coisacentralizado’.

 

O jovem e o idoso – A lição que fica é esta: O envelhecimento é vontade de Deus, então que seja includente com todos, mesmo com quem está na idade avançada. A felicidade é a única coisa que podemos dar sem possuir. Isto é coisa da providência e de quem pensa um pouco. Outro detalhe, o idoso sabe o que é ser jovem, mas o jovem não sabe o que é ser idoso. O idoso sabe como o jovem se sente como está mudando. O jovem pode, sem preconceito etário, compreender mais, ser mais o ‘universo do idoso’, para sentir o que ele está sentindo.

 

Reflexão – Esse é o norte de todos. Não é preciso ordenar que as crianças brinquem! Não é preciso ordenar que o músico toque! Não é preciso ordenar que as pessoas amem afinal o ancião não perdeu a sua identidade! Não subestime quem está na idade provecta, mas, esforça-se para suportar a prova do tempo. E como o tempo pesa! A pior coisa é dever gratidão a quem não está mais presente.

Que pena que a gente aprende tardiamente a diferença entre o útil e o inútil. Esse é o segredo da existência, compreender o que é importante, e aceitar o que é suficiente, sem murmurar... E se você consegue ler estas linhas, vai ter sensibilidade para compreender melhor o que está escrito nas entrelinhas... Verdades... Como, ter um sonho... Depois outro sonho... Depois outro sonho... Depois...

 

Antônio Valdo A. Rodrigues

e-mail: valdo11rodrigues@yahoo.com.br

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