Os devaneios

“A vida é um sonho, mas um sonho, só um pouco mais claro do que aqueles que sonhamos ao dormir”. (Marcel Proust)


O que é devanear? Uma espécie de tumulto interior soando alto e forte? Devanear é sonhar acordado? É fantasiar a realidade para que a vida tenha mais sabor? É tornar a alma jovem e diminuir a amargura por ver o tempo passar amenizando o envelhecer? Devanear é um pouco de tudo isso.

Podemos fazer uma analogia, comparando o devaneio com um “coágulo emocional”, algo que precisa ser diluído. O devaneio existe quando se está só, em silêncio ou ouvindo boa música, clássica, orquestrada, por exemplo. Esse é o momento para aquele mergulho para dentro para ficar sabendo direitinho, quem a gente é. Compreender como a gente é. Principalmente decidir o que se virá a ser. O devaneio é uma tentativa para construir a “realidade” onde ela está incompleta.

O devaneio torna o passado mais palpável, palpitante. Ele invade a intimidade da alma e desperta ansiedades adormecidas. Ninguém vive desconectado do passado. O devaneio é a abstração que traz a recordação de algo que não se sabe bem explicar, mas que é presença marcante em nossa vida.

Todos nós temos direito ao esquecimento, mas o esquecimento não respeita esse nosso direito. Há sempre um retrovisor sem censura a nos investigar como flechas, revelando o que um dia existiu. Mesmo quando a vida é boa, tanta coisa pode faltar para torná-la mais completa. No lugar do amor idealizado e açucarado sempre há desilusões. Mas ao devanear nada é impossível, tudo renasce e se renova na fantasia da imaginação. Não se vive só de saudosismo, mas ele é um lenitivo.

Quando o devaneio dá o seu ar de graça ele causa uma espécie de “frio na alma”. É uma mistura de nostalgia, paralisia emocional atrelada ao passado, que fala de rompimentos e alegrias perdidas. É como se o mundo estivesse perguntando: “Por que você está sentindo saudade?” Ou talvez te fazendo uma proposta: “Se você pudesse fazer uma viagem sem regresso o que e quem você levaria?”


Convite aberto para fazer um exercício de devaneio.

Antes vamos conhecer um pouco sobre Robert Alexander Schumann. Ele foi um músico pianista alemão. Aos 20 anos descobriu seu grande afeto: Clara, entusiasmada por boa música e estudiosa de piano. Schumann apaixonou-se perdidamente por ela tendo composto a música à qual deu este nome: “Devaneio”, dedicada à sua futura mulher: Clara Josephine Wieck. O músico executava a bela melodia Devaneio para agradar a sua amada.


Mas o treino prático para devanear consiste no seguinte: através da internet encontre o nome Schumann e vai ser fácil localizar a música Devaneio. Agora é só ouvir a composição e não pensar em nada. Basta deixar o seu pensamento livre e ele vai pensar por você. Isto é devanear! É transitar por expectativas não tão esquecidas. É uma forma de dar espaço, tempo e vez à saudade. O devaneio pode revelar uma melancolia que insiste em vir à tona. Mas há tambem o lado prazeroso, pode ser acessado para evocar momentos de rara beleza e luz.

Para pensar: “A alma é um cenário. Por vezes, ela é como uma manhã brilhante e fresca, inundada de alegria. Por vezes a alma é como um pôr de sol, triste e nostálgico”. (Rubem Alves) É, faz muito sentido!


Reflexão – Nós e nossas fantasias nostálgicas... O devaneio é um aprendizado de amor. É partir de cacos do passado para acertar mais no presente, talvez com a passagem de novos episódios. Esse é o prazer de devanear: resgatar o tempo perdido sem jamais olvidar as coisas boas que ainda estão para acontecer...

Tudo tem seu tempo, é só não fazer a realidade mais estranha e dura do que já é. As coisas estão no mundo e nosso livro da vida está sendo escrito. Há ainda muitas páginas em branco a espera de roteiros originais. O detalhe é que o Criador sabe quando, onde e como vamos tornar realidade o que hoje é apenas uma alegoria em nosso imaginário...

A idéia é essa, Deus se agrada daqueles que buscam sabedoria para compreender a vida do jeito que ela se apresenta e na maioria das vezes, cheia de ausências...


Antônio Valdo A. Rodrigues
Clima Bebedouro

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